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terça-feira, 22 de junho de 2010

Maus presságios para o IFRS

Por Augusto Korpus

O International Financial Reporting Standards (IFRS) tem sido saudado, de modo geral, como uma iniciativa positiva para o desenvolvimento da governança e dos mercados. Nesse artigo, entretanto, gostaríamos de remar contra a maré e fazer uma análise mais fria do tema.

Para começar, devemos lembrar qual foi a razão principal da elaboração do IFRS. Pela sua própria nomenclatura, percebe-se que a meta era padronizar as normas contábeis e facilitar a comparação entre demonstrações financeiras de diversos países. Sua aplicação se iniciou nas companhias abertas europeias e foi, paulatinamente, sendo adotada em outras regiões por meio da conversão das normas contábeis locais para as normas do IFRS, inclusive o Brasil.

O IFRS pode ser caracterizado como uma lista de pronunciamentos contábeis baseados em princípios e não em regras, como ocorre com alguns padrões contábeis (US Gaap, por exemplo). Essa característica dificulta bastante a adronização, pois cada país pode aplicá-lo de acordo com seus próprios interesses, sejam eles de natureza política, fiscal ou por alegados impactos macroeconômicos. Nem mesmo na Comunidade Econômica Europeia as normas são aplicadas de maneira equânime. Não há um organismo com mandato para forçar uma utilização uniforme do IFRS nos diversos países. Essa questão também se aplica, numa dimensão diferente, entre as empresas: como os princípios estão sujeitos a interpretações, situações semelhantes podem ser tratadas de modo distinto entre as companhias.

Dentre as características das demonstrações financeiras elaboradas sob as normas do IFRS está a aplicação do valor justo (“fair value”) para uma série de ativos e passivos. Esse mecanismo foi adotado devido ao desejo dos formuladores do IFRS de obter, por meio das demonstrações financeiras, um valor de patrimônio líquido o mais próximo possível de seu verdadeiro valor econômico. Como se sabe, esse valor econômico é derivado do valor presente dos fluxos de caixa futuros. Desse modo, as demonstrações financeiras deixam de focar essencialmente o resultado das transações realizadas (ou passadas) e passam a incorporar as expectativas a respeito do desempenho futuro. Não é necessário se alongar muito sobre a questão para perceber que essa alteração provoca um aumento na carga de discricionariedade das demonstrações financeiras.

Esse fenômeno pode ser observado nas avaliações de investimentos de alguns dos títulos ligados a hipotecas subprime” no momento da crise de 2008. Como os títulos não possuíam liquidez, suas estimativas de valor justo foram construídas com premissas dissociadas da realidade de mercado e, como consequência, seus valores estavam superestimados. Outra evidência de discricionariedade ocorre no registro do “goodwill” resultante da aquisição de companhias. Nesse caso, o responsável último pelo ajuste do valor de mercado (“impairment”) — o CEO da companhia — usualmente foi também quem contribuiu para a formação daquele “goodwill”. Há um claro conflito de interesse nesse caso, que pode vir a ter um impacto substancial no resultado da empresa. Dessa maneira, é fácil constatar que o “impairment” normalmente ocorre quando o CEO atual não foi o responsável pela aquisição. Aqui, um evento econômico (o “impairment”) tem seu reconhecimento nos livros contábeis afetado em razão do interesse dos administradores.

Respondendo à questão colocada no artigo, o IFRS provavelmente vai ser implementado de acordo com o esperado, porém o resultado não deve ser o imaginado pelos seus formuladores. Afinal, como fazer os até agora 110 países comprometidos com sua utilização aplicarem a mesma abordagem em ambientes tão distintos quanto Alemanha e Haiti ou Quênia e Holanda? Como evitar que questões sensíveis em determinados mercados (remuneração no Brasil, programas de opções de ações nos EUA, etc.) sejam tratadas pelos reguladores de acordo com os princípios elaborados para o IFRS?

Acreditamos que, mesmo após a implementação do IFRS, ainda existirão diferenças relevantes entre os critérios contábeis adotados pelas empresas. Ao compararmos o desempenho contábil de duas ou mais companhias, ainda teremos que atentar a eventuais distorções contábeis para fazer uma análise correta.

Fonte: Capital Aberto


Nota Blogabilidade:

O Blogabilidade objetiva sempre dar a oportunidade para que seus leitores tenham a capacidade de formar sua própria visão crítica e, para isso, publicamos notícias sempre de forma imparcial.

A implementação das IFRS para o normativo brasileiro é algo que precisa, ainda, de muito estudo por parte de nós contadores. Como o texto fala, o padrão internacional foca a essência sobre a forma, sendo que esta essência pode ter abordagens diferentes, dependendo do grau de desenvolvimento da economia de um país.

É importante ressaltar que, o IASB recentemente publicou sua prestação de contas e, quem tiver a oportunidade de lê-la, verá que mais de 30% das receitas do IASB são provenientes de doações das Big Four (E&Y, PwC, Dtt e Kpmg), e isto deve ser considerado antes de qualquer opinião sobre as normas emitidas por tal órgão.

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